Acordou cedo, mas era feriado. "Acordar cedo para quê?", perguntou-se. "Nem sempre é possível controlar o sono", concluiu. Levantou-se da cama, usou o banheiro, foi para o outro quarto e ligou o computador. A inscrição do curso que havia iniciado dois anos antes venceria em um mês, portanto precisava finalizá-lo o quanto antes. Sempre foi o tipo de pessoa que acumula prazos. Escreveu algumas coisas em um papel branco de uma forma tão simétrica que mesmo se usasse uma régua não ficaria tão bom. Sentiu fome. Foi até a cozinha e preparou algo para comer. Lembrou-se da noite anterior. Uma discussão ocorreu e algumas lembranças foram ressuscitadas. Sentimentos que estavam adormecidos despertaram e o fizeram recordar-se de quem um dia já foi. Não gostou nada disso. É como se estivesse revivendo as mesmas situações que no passado quase o fizeram desistir de tudo. Levou a comida para o quarto. Sentiu-se só, da mesma forma como se sentia no passado. Pensou em sair de casa, mas não tinha destino. Mesmo assim desligou o computador, vestiu uma roupa qualquer, entrou no carro e saiu, não sem antes colocar o celular em modo avião. "Não quero contato com ninguém", pensou, da mesma forma como pensava há alguns anos. Dentro do carro, ligou o som. As músicas tocaram no modo aleatório e vez ou outra ele pulava para a próxima quando não gostava de alguma. Na velocidade da via, dirigia prestando atenção nas letras das canções. É como se não estivesse ali e tudo fosse uma criação da sua cabeça. Pensava em várias coisas ao mesmo tempo, sem necessariamente conectar os seus pensamentos para que fizessem sentido. Sua tristeza aumentava a cada novo minuto e sentia que precisava fazer algo com aquilo que estava sentindo. Imaginou o que poderia acontecer se propositadamente desviasse a direção do carro para ir de encontro a uma das árvores que passavam ao seu lado. Talvez morresse, talvez não. Precisava de alguma situação diferente da vida sem graça que levava. Esses mesmos pensamentos o rodeavam no passado. Pular do sexto andar, deitar-se no trilho do metrô, jogar-se de um caiaque no meio do lago mesmo sabendo que não sabia nadar. "Como seria?", pensou, mas rapidamente desviou o pensamento, como sempre fez. "Preciso escrever", mas escrever o que necessariamente? Coisas tristes? Era só o que sabia fazer. Lembrou-se de quando escrevia no passado e como isso o fazia bem. Não queria escrever sobre essa sensação, porque já o fizera inúmeras vezes. Virou à direita para acessar um parque qualquer. Gostava de pegar aquele caminho, porque precisava passar, durante uns poucos dez segundos, debaixo de algumas palmeiras que deixavam a paisagem estranhamente linda. Ele sempre buscava esses dez segundos como se fossem capazes de recarregar suas energias. Curiosamente, estava tão distraído que não observou quando atravessou as tais palmeiras. "Preciso parar", pensou, e assim o fez. Escolheu o estacionamentoe mais agradável aos olhos e depois uma vaga qualquer. Estacionou o carro, ligou o ar condicionado, abaixou o volume do som e prestou-se a escrever em um bloco de notas do celular. Sabia que tinha pouco tempo, pois a sensação de prazer enquanto escreve dura no máximo dez minutos. Sabia que quando esse tempo passasse sua inspiração iria embora. Olhou para frente e para os lados. Um carro azul estava estacionado à direita e, mais à frente, um branco. Havia chovido um pouco minutos antes, mas agora o sol predominava. A grama nos canteiros estava verde e assim também estavam as folhas das árvores, que eram baixas. No céu, algumas nuvens carregadas e mais ao longe observava uma roda gigante que não trabalhava no momento. Algumas pessoas faziam caminhada nos mas diversos trajes, outras apenas permaneciam sentadas na grama enquanto alguns poucos pássaros pairavam sobre o ar, como se estivessem em meio a uma brincadeira muito divertida. Sabia que a inspiração já havia ido embora, mas recorria à descrição das coisas ao redor apenas para continuar escrevendo. Decidiu sair do carro e procurar um banco qualquer para sentar. Ali continuaria contemplando os detalhes ao redor, mas agora com uma sensação de alívio. Escrever sempre o ajuda.
Pequenos relatos
4 de março de 2021
2021. Madrugada. Há quase onze anos criei este blog e comecei a postar textos que eu pensava e escrevia quando estava sozinho. Eu tinha 16 anos e hoje tenho 27. Penso que uma das melhoras coisas que fiz na vida foi ter deixado aqui registros de versões de mim mesmo ao longo dos anos. Quando leio, relembro quem era e encontro algumas pistas que ajudam a explicar quem eu sou hoje.
O passado às vezes é sombrio. Algumas coisas eu me recuso a lembrar e deixo quietinhas em algum lugar escondidas na mente, e finjo que não aconteceram. Há pessoas que dizem que isso não é saudável e que todos devemos encarar nossos fantasmas de frente para superar nossas próprias tragédias. Bom, deixo essa missão para quem quiser, porque eu estou confortável com meus fingimentos e não me importo de simplesmente ignorar o que já me fez mal. Por outro lado, outros acontecimentos não foram bons, mas não causaram traumas. Destes eu gosto de lembrar. O blog é útil para estes casos.
Hoje decidi escrever alguma coisa. Tenho adiado isso há anos. Já pensei, inclusive, em criar uma rotina de escrita, porque gosto e isso me ajuda, mas nunca coloquei em prática (acho que isso nunca vai acontecer, na verdade). É como uma promessa de ano novo que se renova todos os anos, mas nunca é cumprida.
Não escolhi pauta. Apenas abri um bloco de notas e comecei a escrever. Nada planejado. Como sempre fiz, escrevo agora para mim mesmo, sem pretensão de que alguém leia, mas sei que por ser público talvez um dia uma pessoa caia de paraquedas e acabe lendo. Se é o seu caso, seja bem-vindo(a) ao meu mundo particular.
Bom, hoje li alguns textos que escrevi e automaticamente resgatei coisas da memória. É como se as palavras fossem uma fotografia, porque quando leio consigo me lembrar exatamente como me sentia naquele momento. Elas são semelhantes a um perfume na roupa, um aroma de comida no fogão ou o som de uma música tocando no fone de ouvido, pois também são capazes de me transportar para o passado. É quase mágico.
Aliás, uma dúvida que surgiu agora foi a seguinte: por qual motivo lembramos com um aperto no peito das coisas que aconteceram no passado, sejam elas boas ou ruins? Por que sentimos isso? Isso piora com o passar dos anos. A vida é uma coleção de saudades...
Enfim... Não tenho mais as mesmas inspirações que eu tinha antes, porque em épocas anteriores conseguia dedicar mais tempo às minhas reflexões. Lembro que ficava no meu quarto com a porta trancada pensando, lendo, buscando conteúdos na Internet, sempre com o intuito de descobrir mais e mais coisas sobre a vida, a existência e, consequentemente, sobre mim mesmo. As responsabilidades da vida eram reduzidas e por esse motivo conseguia extrair muito mais insumos do meu ócio. Isso acabou. Embora eu ainda tenha muitas convicções iguais às de antes, não dedico mais tanto tempo para a reflexão. Pode ser um erro, mas são os caminhos para onde a vida me levou. Paciência.
A tristeza era um combustível importante e eu me sentia assim com frequência. Não havia um motivo específico. Geralmente era consequência dessas reflexões. Sempre fui inquieto, inconstante, incomodado com a realidade ao meu redor (que nunca fez sentido para mim). Tudo isso me causava angústia, desespero, vontade de sair correndo sem destino. Como não havia atitude material que me fizessse aliviar essas sensações, eu escrevia. E como me sentia bem com isso! A cada texto escrito eu me sentia aliviado, esvaziado. Nada me fazia sentir da mesma forma.
Mais uma vez digo que hoje é diferente. A normalidade da vida não me permite o luxo de ficar deitado apenas pensando. Tudo é mais acelerado e outras pessoas dependem que eu esteja pronto quando precisarem de mim. Eu não sou mais um fim em mim mesmo...
Esse texto não tinha objetivo, planejamento e, obviamente, não terá final. São apenas pontas soltas, talvez desconexas. Um novo registro para o futuro.
Finalmente escrevi. Novamente me sinto aliviado. Ufa!
Não seja você mesmo(a)!
3 de abril de 2019
Imagino que você já tenha escutado a frase “seja você mesmo(a)!” algumas centenas de vezes durantes sua vida. Esse conselho é bastante comum e é repetido como um mantra pelas pessoas que acreditam que “ser quem você é” é a forma mais autêntica de se apresentar ao mundo e expressar a sua própria personalidade. Parece fazer muito sentido acreditar que ser quem nós somos é um bom caminho para aceitar nossas próprias peculiaridades, mas você já parou para pensar sobre o que significa tudo isso? Bom, se você clicou no link deste texto, tenho bons motivos para acreditar que ao menos tem alguma curiosidade sobre o tema. Outras hipóteses prováveis para ter chegado até aqui são: 1) você não está satisfeito(a) com quem você é; 2) você tem dificuldade em ser de fato você mesmo(a) e quer tentar adotar outra estratégia; 3) você ainda não conseguiu descobrir quem você realmente é. Pois bem, vamos conversar um pouco...
Quando alguém diz que as pessoas precisam ser aquilo que elas são em sua essência, temos que refletir sobre duas questões. A primeira é “quem sou eu?” e a segunda, “qual é a nossa essência?”. Perceba que são duas perguntas extremamente difíceis de processar. Durante milênios os seres humanos têm tentado responder a isto, o que demonstra que “ser quem você é” é muito mais complexo do que sugere a simplicidade do conselho.
Antes de mais nada, afirmo que a busca por quem somos é uma busca inútil, e isso se explica pelo fato de que nós estamos mudando o tempo todo, portanto quando pensamos que descobrimos quem nós somos já deixamos de ser. Mudamos enquanto crianças, enquanto adolescentes, enquanto adultos, enquanto velhos e, pasme, enquanto mortos. Enquanto crianças, experimentamos as coisas pela primeira vez e a cada novo encontro mudamos um pouquinho. Enquanto adolescentes, enfrentamos o mundo e mudamos junto com ele. Adultos, temos a experiência a nosso favor e sabemos que não podemos cometer os mesmos erros do passado e assim mudamos a forma de agir. Enquanto velhos, colecionamos histórias, mas continuamos sendo transformados por elas. Por fim, quando morremos, as pessoas que ficam são as responsáveis por compartilhar nossas memórias e criar imagens diferentes sobre quem de fatos fomos durante a vida. Assim sendo, a pergunta “quem eu sou?” pode ser substituída por uma mais fiel a uma realidade que é mutável: “quem estou sendo?”.
A segunda pergunta, “qual é a nossa essência?”, tem muita relação com o questionamento sobre quem nós somos. Isso porque quando acreditamos que existe uma resposta para “quem sou eu?” automaticamente acreditamos que existe uma essência que nos define em última instância. Pois bem, se anteriormente entendemos que “não somos alguma coisa”, mas que ao invés disso “estamos sendo alguma coisa diferente o tempo todo”, parece simples concluir que não existe uma essência por trás do nosso eu. Algumas pessoas podem argumentar que, mesmo que mudemos o tempo todo, sempre existirá um “eu” imutável que se fará presente em todos as situações da vida, como uma unidade indivisível e representativa de nossa dita essência, que por vezes nos é dada de forma divina. Bom, na verdade as reações e comportamentos semelhantes a diferentes situações e episódios da vida não são a expressão do nosso “verdadeiro eu”, mas apenas uma manifestação da experiência que adquirimos durante a vida ou, em último caso, uma manifestação de nossos instintos mais primitivos, herdados geneticamente. Assim sendo, a busca por uma essência também seria uma busca inútil, pois na verdade o que temos são manifestações comportamentais com base em experiências e códigos genéticos.
Até aqui concluímos duas coisas: não há como definir o que somos com precisão, pois mudamos o tempo todo; e não há como falar em essência, pois na realidade o que temos são reações e comportamentos repetitivos (quando expostos a situações semelhantes) e adaptáveis (quando as situações são diferentes, mas exigem uma ajudinha da nossa experiência para definir a melhor forma de agir) . Depois de tudo isso, parece complicado se falar em “ser quem nós somos”, haja vista o que acabamos de concluir. Bom, destruir conceitos é fácil. A parte mais difícil é propor uma outra forma de enxergar o problema, mas não custa tentar...
Se não somos algo, mas estamos sendo, e se não existe uma essência, o que nos resta? Simples: aceitar que podemos ser aquilo que queremos ou aceitar que precisamos ser diferentes (tendo em vista as nossas vontades e as nossas necessidades). Isso é libertador, pois tira da gente o peso de ter que desvendar os mistérios da essência que reside no nosso suposto “eu” e nos dá a leveza de podermos ser quem nós quisermos ou mesmo ser aquilo que a situação exige que sejamos. Trocamos uma reflexão quase que mística, que tenta tirar conclusões sobre algo que não existe, por uma investigação mais racional e sincera sobre quem podemos de fato ser. Deixamos de lado a ideia de que temos que encontrar o nosso “eu” antes de qualquer coisa, e que só seremos felizes quando alcançarmos esse conhecimento, pela ideia de que somos livres para criarmos o nosso próprio “eu”, respeitadas as limitações que a própria vida moldou (seja de forma genética ou de forma aprendida) e que podemos ser felizes assim mesmo.
Sendo assim, não é errado que assumamos papéis diferentes em diferentes situações da vida; não precisamos ser os mesmos o tempo todo por ser um esforço inútil, já que de fato nunca somos os mesmos; não precisamos nos martirizar por não conseguir definir quem nós somos, porque realmente não somos, mas estamos sendo; não temos que aguardar o dia em que descobriremos qual nossa essência para sermos felizes, porque a essência não existe e podemos ser felizes hoje mesmo; não há problema se gostamos de alguém hoje e amanhã deixamos de gostar, porque isso não nos torna falsos ou cruéis, mas mostra apenas que somos sinceros com nossos próprios sentimentos e com as pessoas pelas quais sentimos algo; não precisamos nos auto afirmar o tempo inteiro, porque estamos em constantes mudanças e se insistimos em fazer parecer que somos algo, ao mesmo tempo estamos nos privando de experimentar as possibilidades da vida, mesmo aquelas que vão de encontro àquilo que pensamos sobre nós mesmos; entre muitos outros exemplos. Tudo isso nos ajuda, também, a ser mais tolerantes com as outras pessoas, porque elas também passam por todo esse processo de conhecimento sobre quem estão se tornando, e quando sabemos como funciona tudo isso é mais fácil aceitar que elas também merecem a liberdade de ser e fazer o que quiserem.
Para encerrar, mais uma vez sugiro cuidado para não cair na tentação de tentar descobrir mistérios que não existem e que são irrelevantes, além de dificultadores. Deixo o recado: não seja você mesmo(a)! Ao invés disso, seja quem você quiser ser e faça o que precisa ser feito hoje e, enquanto sobrar tempo, seja feliz!
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Manhã de domingo
12 de agosto de 2018
Acredito que essa é a segunda vez que me atrevo a escrever sobre as manhãs. Em um passado não tão distante, dizia que encontrava beleza nas primeiras horas do dia. Surpreendo-me ao perceber que essa sensação ainda provoca coisas boas em mim, como se, mesmo que eu mude tanto e tão profundamente, isso permanecesse igual.
Hoje sento em uma cadeira de plástico branca enquanto leio um livro qualquer. Tenho em minhas mãos o segundo copo de café do dia e ao redor o silêncio que tanto me faz bem. Vez ou outra ouço o ruído de vozes dos vizinhos e o bater das portas da casa de minha tia. Ao longe, alguns pássaros cantam e perto de mim a Afrodite, minha gata, caminha inquieta, como se procurasse algo que nunca foi capaz de encontrar. Tudo isso resgata o que mais há de poético em mim. Renova minhas energias.
É incrível como a gente consegue transportar as ideias para outros lugares sem mover sequer um músculo do corpo. Aqui, sentado, viajo. O céu bem limpo talvez sinta falta das nuvens, mas carrega nessa ausência uma beleza sem igual. Bate um vento leve, quase frio, para trazer equilíbrio para a quentura que o primeiro sol traz consigo. O corpo agradece.
Contemplo a vida. Sou grato por poder sentir.
O dia dos demais se inicia. O silêncio é quebrado. Respiro. Sorrio. Após quase dois anos, escrevo algo. Nada tão profundo, mas concluo que é preciso subir à superfície de vez em quando para respirar e esvaziar a mente das perturbações cotidianas.
A vida vale a pena.
Medo de Abraços
29 de outubro de 2016
Viver lá fora me exige muita energia. Sempre preferi o silêncio e a calmaria, e do portão de casa para fora é tudo muito ruidoso e caótico. Preciso, todos os dias, assumir personagens por necessidade e conveniência. Não sou mais ingênuo a ponto de querer que o mundo se adapte ao que sou, e por isso aprendi a me adaptar ao mundo como ele é. Um sinal de amadurecimento, talvez. Condescendência, quem sabe?. Mas a própria condescendência não é um requisito para o amadurecimento? “Aceite o mundo como ele é e aguente as pontas!” Sim, crescer é encarar as coisas como elas são e formular estratégias para conseguir suportá-las sem muito sofrimento. Sem choro!
Tudo isso não é mais problema para mim. Apesar de ser cansativa a rotina, a adaptação é sempre divertida por conta do caráter desafiador que a ela é intrínseco. Aprendi a achar graça de toda essa loucura que é viver. Não tento mais entender e apenas sigo em frente. Ignoro com alegria o fato de que a vida não tem sentido algum.
Quem me lê pode estar se perguntando o que todo esse papo tem a ver com abraços. Ora, tem tudo a ver! Como já disse, viver lá fora exige muito esforço meu. Isso porque sempre fui uma pessoa introvertida, e pessoas assim têm dificuldade para compartilhar a intimidade. Além disso, precisam se esforçar para dividir seu próprio espaço com alguém e se protegem quando tentam invadi-lo. Bom, você consegue imaginar algo mais invasivo do que conviver com pessoas? Estão sempre perguntando como você está, o que fez no fim de semana, quantas pessoas beijou na festa passada e sempre querem te abraçar. Raramente eu quero falar sobre ou fazer essas coisas. Apesar de que hoje eu consigo aceitar fazer parte do teatro social, ainda não aprendi a deixar que as pessoas acessem minha intimidade. Escrevo na intenção de registrar esse fato. O medo de abraços é um símbolo.
Existe uma barreria incrivelmente resistente que impede que eu deixe as pessoas se aproximarem de mim. Se me perguntam como foi o feriado não entro em detalhes. Não cumprimento com abraços porque “abraços são coisas íntimas”*, e caso aconteçam não duram muito. Posso contar nos dedos quantas vezes abracei alguém por muito tempo. Há algo em mim que impede o contato íntimo, que não me deixa à vontade para compartilhar meus sentimentos e impressões mais pessoais. É uma espécie de defesa contra invasores, que na maioria das vezes não são ameaças reais.
Eu fico realmente assustado e com medo de dividir meu espaço, meu tempo e as coisas que eu sinto. Poucas pessoas conseguem se aproximar, e quando se aproximam eu não quero que vão embora. É como se fizessem parte de mim. Há um desejo de compartilhar minhas experiências, contar minha histórias, veja você, mas dificilmente encontro alguém que me transmita confiança. Enquanto isso, sigo recusando solicitações de acesso a mim mesmo.
Não penso que chega a ser um problema, porque não me atrapalha, mas acho que eu poderia viver mais intensamente se não houvesse essas barreiras. No filme Into the Wild, a mensagem final é “a felicidade só é verdadeira quando compartilhada.” Caso isso seja verdade, há muito a ser feito ainda.
De volta ao meu quarto, eu me contemplo e reponho as energias. Hora de dormir. Quem sabe eu não consiga dar um abraço que dure mais de cinco segundos amanhã...
*Palavras de uma amiga que também tem medo de abraços.